Entrevista de Gary Taubes – parte 2

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Mas, a coisa ficou mais esquisita ainda. Alimentos considerados mais ou menos mortais dentro do dogma low fat, se tornam benignas quando olhamos seu conteúdo de gordura. Mais de 2/3 da gordura em um bife, por exemplo, melhorará o perfil lipídico do sangue (ao menos se comparado com uma batata assada). É verdade que os 1/3 restantes aumentarão seu LDL, o “bandido”, mas também melhorar seu HDL. O mesmo é verdade para banha. Se você olhar para os números, você chega à conclusão surreal que você pode comê-la diretamente da embalagem e melhorar seu risco de doença cardíaca.
 
O exemplo crucial de como as recomendações low fat foram ultra simplificadas pode ser mostrado pelo impacto – potencialmente letal, na verdade – nos triglicerídeos, que são as moléculas componentes das gorduras. No final dos anos 60, pesquisadores mostraram que alto nível de triglicerídeos no sangue eram tão comuns quanto alto LDL em pacientes de doenças cardíacas e que levar uma dieta low fat e com alto teor de carboidratos (high carb) poderia aumentar o nível de triglicerídeos assim como baixar o de HDL, acentuando aquilo que Gerry Raven, um endocrinologista de Stanford, chamou de síndrome X. Um conjunto de situações que poderia levar à doença do coração e diabetes tipo 2.
 
Reaven levou mais de uma década para convencer seus pares de que a síndrome X era uma preocupação legítima, em parte porque aceitar esta realidade queria dizer aceitar que dietas low fat aumentaria o risco cardíaco em 1/3 da população. “Por vezes desejamos que estes fatos desapareçam, porque ninguém sabe lidar com eles”, disse Robert Silverman, um pesquisador do NIH, numa conferência em 1987. “Altos níveis de proteína podem prejudicar os rins. Altos níveis de gordura são ruins para o coração. E agora Raven está dizendo para não comermos muitos carboidratos. Temos que comer algo!”.
 
Claro que os envolvidos em escrever os guias nutricionais queriam que os americanos comessem menos junk food, seja lá como você definir este termo, e comer mais como se faz em Berkeley, California. Mas, não seguimos estas diretrizes. Comemos mais amidos e carboidratos refinados, porque caloria por caloria, eles são os mais baratos que a indústria alimentícia pode produzir, e podem ser vendidos com o maior lucro possível. E também é o que gostamos de comer. É muito raro encontrar alguém que não prefira um cookie ou iogurte adoçado a um brócoli.
 
Todos os reformistas deveriam estar conscientes da lei das consequências não desejadas”, diz Alan Stone, que era diretor de staff no comitê de McGovern. Stone me disse que ele tinha um pressentimento a respeito de como a indústria alimentícia responderia a estas novas diretrizes quando as audiências foram feitas. Um economista o chamou de canto, ele disse, e deu uma aula de desincentivos que o mercado tinha para uma alimentação saudável: “Ele me disse que se você criasse um novo mercado com um alimento industrializado novinho em folha, desse um nome bacana, colocasse uma boa grana em propaganda, você poderia ter o mercado todo para você, obrigando a concorrência a te acompanhar. E isso não pode ser feito com frutas, verduras e legumes. É difícil diferenciar uma maçã de uma maçã.
 
Os pesquisadores do campo da Nutrição também tiveram sua importância, tentando justificar com ciência a ideia de que os carboidratos eram os nutrientes ideais. Já se sabia, por quase um século, e era considerado quase irrelevante para o entendimento da obesidade, que um grama de gordura corresponde a nove calorias, enquanto que para carboidratos e proteínas essa relação é de um para quatro. Agora, isso tinha virado a proposição à prova de falhas da doutrina low fat: reduza as fontes mais densas em calorias na dieta e você perderá peso. Então em 1982, J.P. Flatt, um bioquímico da Universidade de Massachusetts, publicou sua pesquisa demonstrando que em uma dieta normal, é muito raro o corpo humano converter carboidratos em gordura corporal. Isso foi interpretado erroneamente pela mídia e por alguns muitos cientistas como um sinal verde para comer carboidratos, pois eles não te fariam gordo. E não é esse o caso, diz Flatt. Mas esta má interpretação da afirmação de Flatt tomou vida por si só porque estava de acordo com a noção de que gorduras engordam e carboidratos são inofensivos.
 
Consequentemente, as maiores tendências de dietas nos EUA desde os anos 70, de acordo com a economista da USDA Judith Putnam, tem sido diminuir as calorias provenientes da gordura e aumentar grandemente o consumo de carboidratos.”. Para ser mais preciso, o consumo anual de grãos aumentou quase 60 libras (+/- 30 quilos) por pessoa, e o de adoçantes calóricos (principalmente HFCS) em 30 libras. Ao mesmo tempo, repentinamente começamos a consumir mais calorias no total: até 400 calorias por dia desde que o governo iniciou a recomendação de dietas low fat.
 
Se estas tendências estão corretas, então a epidemia de obesidade pode certamente ser explicada pelo aumento de consumo de calorias – calorias em excesso, afinal, é o que causa aumento de peso – especificamente, mais carboidratos. A questão é por que? A resposta dada pela Edocrinologia 101 é a de que temos mais fome hoje do que na década de 70 e a razão é mais fisiológica do que psicológica. Neste caso, o fato mais importante – ignorado na perseguição à gordura e seus efeitos no colesterol do sangue – é como os carboidratos afetam o nível de glicose no sangue e de insulina. Na verdade, estes sempre foram os culpados, e foi por isso que Atkins e os médicos low carb bateram forte nesta tecla desde o princípio.
 
O principal papel da insulina é regular o nível de glicose no sangue (também chamado de açúcar no sangue). Quando se come carboidratos, eles são quebrados em moléculas de açúcar e transportados pela corrente sanguínea. Seu pâncreas secreta insulina, que faz o açúcar sanguíneo entrar nas células e também o transporta para o fígado, para ser usado como combustível. Por isso que carboidratos afetam o nível de insulina no sangue e gordura não. E como a diabetes juvenil é causada por uma falta de insulina, os médicos acreditavam desde os anos 20 que o único problema com a insulina era não produzir o suficiente.
 
Mas a insulina também regula o metabolismo da gordura. Não conseguimos estocar gordura no corpo sem insulina. Pense na insulina como um interruptor. Quando está ligado, poucas horas após uma refeição, você queimar carboidratos como fonte de energia e guardo o excesso como gordura. Então quando o nível de insulina é baixo, você queimará a gordura estocada, o que não acontece quando seu nível está alto.
 
Aqui a coisa fica inevitavelmente complicada. Quanto mais gordo você for, mais insulina seu pâncreas bombeará no pós-refeição, e aumentarão as chances de você desenvolver o que se costuma chamar de “resistência à insulina”, que é a causa subjacente da Síndrome X. Na verdade, suas células ficam insensíveis à ação da insulina e então você precisa de quantidades cada vez maiores para manter o nível de glicose no sangue (glicemia) em patamares aceitáveis. Portanto, quando você está ganhando peso, a insulina faz com que estocar gordura seja mais fácil. Mas, se suas células forem insensíveis à insulina, seu papel de estocar gordura será cada vez mais dificultado e seu peso será mantido sob controle.
 
Nesta situação, a resistência à insulina fará com que seu pâncreas produza ainda mais insulina, iniciando um ciclo vicioso. O que começa tudo – obesidade, insulina elevada ou resistência à insulina – é o tipo de problema “ovo-galinha” que ainda não foi solucionado. Um endocrinologista descreveu está questão como digna de prêmio Nobel.
 
A insulina também afeta profundamente a sensação de fome, apesar de que ainda não se sabe o porquê. Por um lado, a insulina pode indiretamente causar uma sensação de fome quando reduz o nível de açúcar do sangue. Mas até que patamar o nível de açúcar do sangue tem que cair até que você sinta fome? Isso também ainda não tem resposta. Concomitantemente, a insulina interfere no cérebro para suprimir a fome. A teoria, explicada por Michael Schwartz, um endocrinologista da Universidade de Washington, é a de que o potencial da insulina inibir o apetite iria contrabalancear sua propensão a estocar gordura no corpo. Em outras palavras, conforme você ganha peso, seu corpo gera mais insulina após cada refeição e isso, por sua vez, inibiria seu apetite o que faria você comer menos e perder peso.
 
Entretanto, Schwartz imagina que pode haver um mecanismo que acaba com esse equilíbrio: se seu cérebro também apresentar resistência à insulina assim como seus músculos e gordura quando são inundados com ela. Nesta situação, a alta dose de insulina produzida não seria compensada pela inibição de apetite, porque seu cérebro não mais registraria o aumento na concentração de insulina.
 
David Ludwig, o endocrinologista de Harvard, diz que é o efeito da insulina na glicemia o responsável por este fenômeno. Ele lembra que quando diabéticos recebem muita insulina, a glicemia baixa e ficam com muita fome. Eles ganham peso porque comem mais, e a insulina promove a deposição de gordura. O mesmo acontece com animais de laboratório. Isso é efetivamente o mesmo que acontece quando comemos carboidratos – em particular açúcar e amidos como batata e arroz, ou qualquer coisa feita com farinha, como uma fatia de pão. No jargão especializado, estes alimentos são denominados de alto índice glicêmico, o que significa que são rapidamente absorvidos e vão parar na corrente sanguínea. Como consequência, um pico de açúcar no sangue acontece seguido de um pico de produção de insulina. O açúcar é então utilizado ou armazenado e apenas algumas horas após a refeição, sua glicemia está mais baixa de antes de comer. Como explica Ludwig, seu corpo pensa que “acabou o combustível”, mas o nível de insulina ainda é alto o suficiente para evitar que você queime sua própria gordura para gerar energia. O resultado é fome e um desejo por mais carboidratos. Se trata de um outro ciclo vicioso que favorece a obesidade.
 
O conceito de índice glicêmico e a ideia de que amidos podem ser absorvidos ainda mais rápidos que açúcar apareceu nos anos 70, mas novamente não influenciou as recomendações de saúde pública, devido às controvérsias existentes à época. Para pensar: se você tivesse aceitado a ideia de índice glicêmico, então consequentemente você teria que aceitar que os amidos que você deveria comer 6 a 11 vezes ao dia eram fisiologicamente indistinguíveis do açúcar. Isso os faria parecer consideravelmente menos saudável. Ao invés de aceitar esta possibilidade, os legisladores simplesmente permitiram que o açúcar e o xarope de milho desviassem a atenção da demonização da gordura. Afinal, ambos são fat-free.
 
Açúcar e xarope de milho em refrigerantes, sucos, chás e bebidas esportivas atualmente fornecem mais de 10% das calorias diárias. Nos anos 80 vimos o aparecimento dos Big Gulps e copos de 32oz de Coca Cola, cheios de açúcar, mas 100% fat-free. Do ponto de vista da insulina e glicemia, tais refrigerantes e sucos – que os cientistas chamam de “carboidratos líquidos” – talvez sejam os piores (refrigerantes diet representam menos de 25% do mercado total de refrigerantes).
 
A essência do conceito de índice glicêmico é a de que quanto mais os carboidratos demoram a serem digeridos, menor o impacto na glicemia/insulina e mais saudável o alimento. Os alimentos com maior índice glicêmico são aqueles feitos de açúcares simples, amidos e qualquer coisa feita com farinha. Verduras e legumes verdes, leguminosas e grãos integrais causam um aumento mais gradual da glicemia pois contém fibras, um tipo de carboidrato não-digerível que deixa digestão mais lenta o que, por sua vez, reduz o índice glicêmico. Proteínas e gorduras tem o mesmo efeito, o que implica que comer gordura pode ser benéfico, uma ideia ainda hoje inaceitável para muitos. Outra implicação do conceito de índice glicêmico é a de que a incidência da Síndrome X, obesidade e diabetes tipo 2, está relacionada aos danos de longo prazo que os constantes picos de insulina que ocorrem quando comemos carboidratos refinados e amidos. Isso sugere uma teoria unificada para estas doenças crônicas, mas que não consegue coexistir com o dogma low-fat.
 
Na clínica pediátrica do Dr Ludwig, ele tem prescrito dietas de baixo índice glicêmico à crianças e adolescentes há cinco anos. Ele não prescreve a dieta de Atkins pois acredita que é desnecessariamente restritiva. Ao invés disso, ele apenas pede aos seus pacientes que substituam carboidratos refinados e amidos com verduras, frutas e legumes. Isso faz com que sua dieta esteja consistente com o senso comum em termos de dietas saudáveis, se bem que incluindo mais gorduras. Sua clínica tem listas de espera de nove meses. Apenas recentemente ele conseguiu convencer o NIH que tais dietas são dignas de estudo. Suas três primeiras propostas de bolsa foram sumariamente rejeitadas, o que talvez explique o fato de que a maioria dos estudos relevantes foram feitos no Canadá e Austrália. Em Abril, entretanto, Ludwig recebeu 1,2 milhão de dólares do NIH para testar sua dieta de baixo índice glicêmico contra uma dieta low fat. Tais estudos talvez ajudem a elucidar o papel da insulina, apesar de que o dr Atkins talvez chegue lá antes.
 
Dr Atkins, de 71 anos, formado na “Cornell Medical School”, afirma que tentou uma dieta low carb pela primeira vez em 1963 após ler a respeito delas no “Journal of the American Medical Association”. Ele perdeu peso com pouco esforço, teve uma epifania e transformou uma clínica cardíaca incipiente em Manhattan em uma clínica de obesidade muito próspera. Nesta época, ele ignorou a comunidade médica e pediu para seus pacientes comerem gordura e proteína o quanto quisessem, desde que não comessem muitos carboidratos. Seus pacientes perderiam peso, ele dizia, porque manteriam o nível de insulina do sangue baixo. Eles não sentiriam fome e teriam menos dificuldade em queimar sua própria gordura corporal. Atkins também lembrou que amidos e açúcar eram prejudiciais porque eles aumentavam o nível de triglicerídeos no sangue, o que era considerado um risco maior de doença cardíaca do que colesterol.
 
A dieta do Dr Atkins é a manifestação definitiva da hipótese alternativa assim como o campo de batalhas sobre o qual a controvérsia gorduras vs carboidratos vai se desenrolar ao longo dos próximos anos. Depois de insistir que Atkins era um charlatão por três décadas, especialistas em obesidade agora estão encontrando dificuldades em ignorar a montanha de evidências de que este tipo de dieta entrega o que promete. Veja o caso de Albert Stunkard, por exemplo. Stunkard vem tentando tratar obesos há cinquenta anos, mas ele me contou que teve sua epifania sobre Atkins e obesidade quando ficou sabendo que o chefe de radiologia de seu hospital perdeu 60 libras fazendo a dieta. “Bem, aparentemente todos os jovens no hospital estão fazendo”, disse. “Então decidimos estuda-la.”. Quando perguntei à Stunkard se ele os seus colegas consideraram pelo menos testar a dieta de Atkins há trinta anos atrás, ele respondeu que não pois pensavam que Atkins era um idiota que apenas queria ganhar dinheiro. Isso desmotivou as pessoas e fez com que ninguém o levasse a sério da maneira como finalmente estamos fazendo.
 
Na verdade, quando o “American Medical Association” escreveu sua crítica mordaz à dieta Atkins em Março de 1973, reconheceu que ela provavelmente funcionaria, mas demonstrou pouco interesse em entender o porquê. Ao longo dos anos 60, o assunto foi objeto de muitos estudos, que chegaram à conclusão de que a dieta Atkins era uma dieta de baixa caloria disfarçada. Que quando se exclui do cardápio massas, pães e batatas, fica difícil comer o suficiente de carnes, verduras, legumes e queijo.
 
Aquilo, entretanto, levantou a questão de por que uma dieta de baixa caloria inibiria a sensação de fome, atributo que Atkins insistia ser o característico de sua dieta. Uma possibilidade era a explicada pela Endocrinologia 101: gordura e proteína são saciantes e, além disso, a ausência de carboidratos e seus altos e baixos de glicemia e insulina ajudariam a te manter sem fome. A outra possibilidade surgiu do fato de que a dieta Atkins era de fato cetogênica. Isso significa que o nível de insulina atinge patamares tão baixos que você entra em um estado chamado “cetose”, que é o que acontece durante jejuns ou fome prolongada. Seus músculos e tecidos, assim como seu cérebro, queimam gordura para obter energia, a partir de moléculas produzidas no fígado chamadas corpos cetônicos. Atkins entendia a cetose como uma forma óbvia de se iniciar a perda de peso. Ele costumava dizer que a cetose era tão energizadora que era melhor que sexo, o que fez com que alguns o ridicularizassem. Uma crítica inevitável à dieta de Atkins era que a cetose era perigosa e deveria ser evitada a todo custo.
 
Quando entrevistei especialistas em cetose, no entanto, eles ficaram do lado de Atkins e sugeriram que talvez a comunidade médica e a mídia em geral confundiam cetose com cetoacidose, uma variação de cetose que ocorre em diabáticos não tratados e que pode ser fatal. “Médicos tem medo de cetose”, comentou Richard Veech, um pesquisador do NIH que estudou medicina em Harvard e tirou seu doutorado em Oxford com o prêmio nobel Hans Krebs. “Eles sempre se preocupam com a cetoacidose associada ao diabetes. Mas a cetose é um estado fisiológico normal. Eu diria até que é o estado normal do homem. Não é normal comer no Mc Donald’s e petiscos a torto e a direito. É normal fazer jejum.
 
Colocado de forma simples, a cetose é a resposta à questão do gene “econômico”. Talvez tenhamos evoluído para estocar gordura em tempos de escassez, afirma Veech, mas nós também evoluímos para consumir essa gordura quando necessário e entrar no estado de cetose. Ao invés de serem venenosos, como a mídia frequentemente os classifica, os corpos cetônicos ajudam o corpo a rodar de forma mais eficiente e fornecem uma fonte alternativa de energia ao cérebro. Veech diz que os corpos cetônicos são “mágicos” e já demonstrou que o corpo roda cerca de 25% mais eficientemente com eles do que com glicose.
 
A conclusão final é a de que nos trinta anos em que Atkins insistiu que sua dieta funcionava e era segura, milhões de americanos a tentaram, enquanto nutricionistas, médicos, autoridades de saúde pública e qualquer um relacionado à doenças do coração, dizia que tal dieta poderia matar as pessoas e demonstraram pouco interesse em descobrir quem estava correto. Durante este tempo, apenas dois grupos de pesquisadores americanos testaram a dieta, ou pelo menos publicaram seus resultados. No início da década de 70, J. P. Flatt e George Blackburn, de Harvard, foram os pioneiros em uma dieta para tratar pacientes no pós cirurgia e depois a testaram em obesos. Blackburn, que depois se tornou presidente da “American Society of Clinical Nutrition”, descreve sua dieta como “Atkins sem excesso de gordura” e afirma que ele teve que dar um nome chique pois de outra forma ninguém o levaria a sério.
 
A dieta era composta de carnes magras, frango e peixe, suplementada por vitaminas e minerais. “As pessoas adoravam”, lembra Blackburn, “A perda de peso era enorme”. Blackburn tratou com sucesso a milhares de pacientes obesos ao longo da década seguinte e publicou uma série de artigos que foram ignorados. Quando obesos de New England começaram a usar medicamentos para controle de apetite, ele desistiu. Ele então aplicou para uma bolsa do NIH para um ensaio clínico sobre dietas populares mas foi rejeitado.”
 
O segundo ensaio, publicado em Setembro de 1980, foi feito no “George Washington University Medical Center”. Duas dúzias de voluntários obesos concordaram em seguir a dieta de Atkins por oito semanas e perderam em média dezessete libras cada, sem efeitos colaterais aparentes, apesar de seu colesterol LDL ter subido. Os pesquisadores, liderados por John LaRosa, agora presidente do “State University of New York Downstate Medical Center in Brooklyn” concluiu que a perda de peso teria acontecido com qualquer dieta testando algo novo em condições experimentais e nunca tentou entender melhor os resultados.
 
Agora pesquisadores finalmente entenderam que a dieta de Atkins e outras low carb tem que ser testadas e tem feito isso comparando-as com dietas tradicionais do tipo baixa caloria e baixo teor de gordura, como as recomendadas pelo “American Heart Association”. Para explicar sua motivação, eles inevitavelmente contam uma de duas histórias: alguns, como Stunkard, me disseram que alguém que conheciam – paciente, amigo, outro médico – perdeu muito peso fazendo a Atkins e, apesar de todos os preconceitos envolvidos, conseguiram manter o peso. Outros diziam estar frustrados com sua incapacidade de ajudar seus pacientes obesos e então olharam para as dietas low carb e decidiram que a Endocrinologia 101 fazia sentido. “Como um médico formado, fui treinado para caçoar de algo como a dieta Atkins”, diz Linda Stern, uma residente do “Philadelphia Veterans Administration Hospital”, “mas eu testei a dieta. E foi ótimo. E acho que talvez isso é algo que possa oferecer aos meus pacientes.
 
Nenhum destes estudos foi financieado pelo NIH e nenhum foi publicado. Mas os resultados foram mostrados em conferências – por pesquisadores do “Schneider Children’s Hospital on Long Island”, do “Duke University and the University of Cincinnati” e pelo grupo de Stern no “Philadelphia V.A. Hospital”. Há também o estudo mencionado por Stunkard, liderado por Gary Foster na “University of Pennsylvania”, Sam Klein, diretor do “Center for Human Nutrition at Washington University in St. Louis” e Jim Hill, responsável pelo “University of Colorado Center for Human Nutrition in Denver”. Os resultados destes cinco estudos são marcadamente consistentes. Participantes de alguma forma da dieta Atkins – seja adolescentes com sobrepeso na dieta por 12 semanas, como em Schneider, ou adultos obesos com média de peso de 295 libras na dieta por seis meses, como na Philadelphia, perderam duas vezes mais peso do que nas dietas de baixa caloria, baixa gordura.
 
Nos cinco estudos, níveis de colesterol melhoraram de forma similar nas duas dietas, mas os níveis de triglicerídeos foram consideravelmente menores na Atkins. Apesar dos pesquisadores ainda serem cautelosos em afirmar isso, tais estudos sugerem que o risco de doenças do coração pode ser reduzido se incluirmos gorduras na dieta ao mesmo tempo que excluímos amidos e carboidratos refinados. “Acho que quando isso for reconhecido”, diz Stunkard, “vai abalar muito do que pensamos sobre obesidade e metabolismo”.
 
Tudo isso poderia ser resolvido o antes possível e daí talvez tenhamos as respostas tão esperadas do porquê engordamos e se isto se deve às forças da sociedade ou escolhas alimentares. Pela primeira vez, o NIH está financiando comparações de dietas populares. Foster, Klein e Hill, por exemplo, receberam mais de 2,5 milhões de dólares do NIH para um ensaio de cinco anos sobre a dieta Atkins em trezentos e sessenta indivíduos obesos. Em Harvard, Willet, Blackburn e Greene tem recursos, apesar de financiados pela fundação sem fins lucrativos de Atkins, para fazer ensaios comparativos também.
 
Se tais ensaios tiverem resultados a favor da Atkins e sua dieta de baixo carboidrato e alto teor de gordura, então as autoridades de saúde pública terão um grande problema em suas mãos. Uma vez que acreditaram no dogma da dieta low fat por vinte e cinco anos, eles deixaram pouco espaço para evidências contraditórias ou mudanças de opinião, se tal mudança fosse necessária para se manter atualizado com a ciência recente. Sob este aspecto, a experiência de Sam Klein é notória. Klein é o presidente do “North American Association for the Study of Obesity”, o que sugere que ele é bastante respeitado pelos membros de sua comunidade. Ainda assim, ele descreveu sua experiência de debater a dieta Atkins numa conferência médica como um aprendizado. “Fiquei impressionado”, ele disse, “com a hostilidade dos acadêmicos da plateia. Sua resposta foi ‘Como você ousa trazer dados desta dieta do Atkins!”.
 
Tal hostilidade vem principalmente de sua ansiedade de que os americanos, se iluminados com um pouco de esperança a respeito de seu peso, vão correr em massa para testar uma dieta que parece intuitivamente perigosa e para a qual ainda não existem dados de longo prazo a respeito de sua segurança e eficiência. É um medo justificável. Ao longo da minha pesquisa, me peguei olhando para um prato de ovos mexidos com linguiça em um restaurante do bairro, pensando que de alguma forma eles iriam entupir minhas artérias e acabar comigo.
 
Depois de vinte anos afundado no paradigma low-fat, é difícil ver a Nutrição de uma forma diferente. Aprendi que as dietas low-fat falham em ensaios clínicos e na vida real e certamente falharam na minha experiência pessoal. Tenho lido jornais dizendo que talvez os vinte anos de low-fat não tenham diminuído a incidência de problemas cardíacos e talvez tenham ajudado o profundo aumento das taxas de obesidade e diabetes tipo 2. Entrevistei pesquisadores que afirmaram que seus modelos computacionais calcularam que levar o nível de gordura saturada na dieta ao que o “American Heart Association” quer, talvez alongasse minha vida por alguns meses, se isso. Eu perdi peso fácil e consideravelmente apenas excluindo carboidratos na minha dieta-teste e ainda assim eu olho para os ovos e linguiça do meu prato e imagino um ataque cardíaco ou obesidade iminentes, o último certamente causado por algum fenômeno bizarro como os que a ciência ainda não entende. O fato de que Atkins teve problemas cardíacos recentemente não ameniza minha ansiedade, apesar de ele assegurar que não tem nada a ver com a dieta.
 
Este é o pensamento que imagino que os nutricionistas, pesquisadores e médicos devem ter para encarar a controvérsia do carboidrato vs gordura. Talvez eles consigam, mas as evidências deverão ser excepcionalmente convincentes. Apesar de este tipo de conversão talvez estar acontecendo neste momento com John Farquhar, professor de pesquisa em saúde e políticas na “Stanford University” e trabalhou por mais de quarenta anos neste campo. Quando eu o entrevistei em Abril, ele me explicou porque dietas low-fat conduzem ao ganho de peso enquanto que dietas low-carb fazem você perder peso, mas ele me fez prometer que eu não diria que ele acredita nisso. Ele atribuiu a causa da epidemia de obesidade ao fato de estarmos obrigando as pessoas a comerem. Três semanas depois, ao ler um artigo de Endocrinologia 101 de David Ludwig no “Journal of American Medical Association”, ele me enviou um e-mail fazendo a seguinte pergunta, não tão retórica: “Será que conseguimos fazer os proponentes da dieta low-fat pedirem perdão?”.

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